A matança do porco é uma tradição que, tal como em outras partes, na freguesia de Gondesende está associada ao frio e ao inverno.
“Até convém estar a gear na matança do porco. É melhor.” Hermínio Tomé, 76 anos - Portela
Antigamente todas as casas de Portela, Gondesende e Oleiros criavam porcos para a matança. Era preciso fazer o fumeiro e o presunto para alimentar a família durante o ano. Por hábito o porco pesava mais de 200 kg e era farto com folhas de negrilho, castanhas, beterrabas, abóboras (conhecidas por aqui como bóbdas), grão. Hoje em dia só alguns continuam a criar e a fazer a matança do porco.
Era hábito juntar a família e os amigos e fazer uma grande festa.
“No dia da matança a família reunia-se sempre. Era uma festa.” Odete Esteves, 60 anos - Portela
Em Dezembro ou Janeiro faziam a matança. Os homens ocupavam-se do “ritual” de matar o porco. Havia sempre pelo menos um homem entre a família ou amigos, verdadeiro mestre, que matava o porco.
Antes de matar o porco era dado o mata-bicho.
Matança Porco
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Matança Porco
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Matança Porco
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“Logo de manhã, antes de matar o porco, era tradição dar leite ou chocolate grosso em barra, que era desfeito no lume e colocávamos um ovo para engrossar. Também dávamos batatas cozidas com pele com bacalhau cozido e polvo cozido.” Emília Pires, 88 anos - Portela
Os homens agarravam o porco e colocavam-no em cima do banco. O mestre de faca afiada, com um golpe rápido e certeiro, espetava o porco de modo a atingi-lo na zona do coração.
As mulheres punham um alguidar debaixo do porco para aparar o sangue. O alguidar levava vinho, cebola e sal. As mulheres estavam sempre a mexer para o sangue não coalhar.
“Uma pessoa entendida matava o porco. Quase todos os homens sabiam matar o porco. O meu homem, o Porfírio, matava o porco.” Emília Pires, 88 anos - Portela
“Tem de se mexer o sangue até arrefecer, senão claro que coalha. Está sabido!” Hermínio Tomé, 76 anos - Portela
O porco era chamuscado com fachucos de palha e giestas para queimar a pele e os pelos. Rapavam muito bem o couro com seixos e facas e lavavam-no com água. Abriam o porco de alto a baixo, tiravam as tripas para um alguidar. Depois com um sobeio (peça usada para prender o jugo ao carro das vacas) penduravam o porco numa traves da adega ou numa escada, com a cabeça para baixo para a carne enrijar e enxugar.
“Tira-se primeiro as tripas e depois o fígado, o boche, a língua e por último o unto.” Hermínio Tomé, 76 anos - Portela
“Os homens penduravam-no, abriam-no e limpavam-no com um pano áspero de sacos feitos no tear. No fim de os homens acabarem de compor o porco dávamos um lanche. Nós, as mulheres, preparávamos o fígado e os garrotes. Eram assados na brasa. A sobra do bacalhau cozido do mata-bicho era frito. Às vezes os homens cortavam o rabo do porco e nós assávamos.” Emília Pires, 88 anos - Portela
As mulheres levavam as tripas para a fonte ou poças e lavavam-nas para tirar a sujidade. Primeiro eram lavados com água e depois com sabão.
“Quando as mulheres chegavam de lavar as tripas tinham sempre vinho doce quentinho.” Hermínio Tomé, 76 anos - Portela
Em casa as mulheres faziam uma mistura com aguardente, alho, louro e limão para tirar o mau cheiro das tripas. Todos os dias lavavam as tripas com esta mistura até ao momento de fazer os chouriços, os salpicões e as alheiras. Escamavam as tripas com vime para ficarem fininhas. Depois as tripas eram apertadas e estavam prontas para fazer os chouriços, salpicões e alheiras.
“Depois do lanche os homens entretinham-se tarde fora a jogar às cartas.” Emília Pires, 88 anos - Portela
À noite havia o jantar. A refeição era composta por canja de galinha, coelho assado ou guisado, perdiz, presunto.
“Os caçadores que fossem à matança do porco iam caçar para a matança. Costumavam caçar muitos coelhos e lebres. Às vezes também calhava uma perdiz. Sabia tão bem! Costumavam juntar caça até demais.” Emília Pires, 88 anos – Portela
“Nas matanças iam à caça uns para os outros.” Infância Gonçalves, 84 anos, Portela
“Quando era nas matanças eram perdizes, eram 7 ou 8 coelhos. Mas também eramos sempre à volta de 30 nas matanças. Lá em cima na minha casa quase nem os potes eramos capazes de fazer, casa pequena, sempre muita gente, garotos… Houve um ano que os homens já tinham tanta caça que já nem quiseram caçar mais, que não depois estragava-se. Dantes havia muito para caçar. “ Adelaide Gonçalves, 82 anos, Portela
Na manhã do dia seguinte, o mestre com a sua arte de desmanchar, desfazia o porco. Picavam a carne para os chouriços e salpicões e faziam os rojões.
“De manhã corta-se a cabeça e desfaz-se o porco.” Hermínio Tomé, 76 anos - Portela
“Picavam a carne para pôr de adobo e faziam os rojões com a carne da barbada para comer durante o ano. O adobo fazíamos com água, vinho, alho, louro, pimenta, sal e rodelas de laranja ou limão. Sabe o que é pimenta? É o pimentão-doce.” Maria Adelina, 80 anos - Portela
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